Direitos das mulheres lésbicas, mulheres em situação de vulnerabilidade extrema e crianças. Fala na Câmara Municipal de Campinas

Boa noite,

Meu nome é Daniela Alvares Beskow, sou escritora e cientista política. Integro o movimento de mulheres, incluindo os movimentos de mulheres lésbicas e o movimento feminista a nível local em diálogo com os níveis estadual e nacional.

Trago para a noite de hoje algumas reflexões sobre a violência cometida contra mulheres lésbicas, contra crianças e contra mulheres em situação de vulnerabilidade na sociedade brasileira. O objetivo de abordar tais assuntos aqui nesta reunião da Comissão da Mulher da Câmara de Vereadoras e Vereadores da cidade de Campinas neste março de 2023 é contribuir para a construção da Carta de Cobranças e Reivindicações à prefeitura da cidade de Campinas no que tange às políticas públicas que têm como objetivo eliminar as violências contra as mulheres no município.

Gostaria de abordar o tema das mulheres em situação de vulnerabilidade extrema:

– Mulheres encarceradas;

– Mulheres em situação de rua;

– Mulheres pacientes em contexto de cirurgia, atendimento médico e trabalho de parto, muitas vezes sedadas ou doentes, vitimizadas pela violência médica;

– Mulheres residentes de bairros com extrema precariedade de infraestrutura básica, por exemplo, com falta de saneamento, água, iluminação nas ruas, moradia precária e sem segurança;

– Mulheres que estão em situação de insegurança alimentar ou fome;

– Mulheres economicamente dependentes e vítimas de relações sociais abusivas;

– Mulheres ameaçadas por ex-companheiros;

– Mulheres vitimadas pela violência sexual e, muitas vezes, maltratadas em serviços públicos de saúde ou segurança e sem acesso à rede de proteção psicológica durante a vida, marcada pelo trauma pelo qual muitas vezes o agressor sequer é punido;

– E outras situações, como mulheres e meninas vítimas da exploração sexual e do tráfico de pessoas.

Mulheres em tais situações se encontram socialmente e muitas vezes, física e emocionalmente fragilizadas e debilitadas, com menos acesso a ferramentas de defesa de possíveis abusos e violência. Logo, são pessoas para as quais o Estado deve ter um olhar reforçado, acompanhado de consistentes políticas públicas que evitem violações de direitos.

O segundo grupo sobre o qual gostaria de falar são as mulheres lésbicas. Atualmente na sociedade brasileira observa-se a existência de pessoas lesbofóbicas – ou homofóbicas, para quem prefere o termo geral – que se sentem no direito de violentar mulheres lésbicas. Essas violências têm ocorrido na forma verbal, psicológica, física, sexual, além da violência patrimonial. A segurança das mulheres lésbicas e o seu direito à vida estão ameaçados e pouco o poder público nos níveis municipal, estadual e federal têm feito para alterar esse contexto. Os espaços públicos e coletivos onde todas e todos temos o direito de estar sem sermos assediadas, agredidas, incomodadas, ameaçadas, atacadas, humilhadas, discriminadas ou violentadas de qualquer forma são desafios diários não apenas para as mulheres lésbicas, mas para todas as pessoas pertencentes a grupos socialmente vulnerabilizados. Aproveito para destacar as mulheres que em sua existência corporal e comportamental, desafiam as normas impostas ao sexo feminino e à feminilidade – entendida enquanto uma ferramenta de exploração e violência – alvos constantes de pessoas que se pensam melhores do que as outras e supõe ter o direito da violência. Andar na rua, utilizar o transporte público ou privado, frequentar espaços de lazer ou comércio, almoçar em um restaurante, ir à uma peça de teatro com a namorada, fazer uma caminhada de domingo de manhã no parque. São constantes as situações de constrangimento que algumas pessoas – reforçadas por um regime estrutural que impõe a heterossexualidade enquanto norma das relações sociais – promovem no cotidiano coletivo, constrangendo mulheres lésbicas e suas famílias e amigos.

Outro contexto que gera preocupação é com as crianças do nosso país e, logo, da cidade de Campinas. Segundo os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, as crianças são os principais alvos de violência sexual, sendo que a maioria dos estupradores são da própria família da criança ou dírculos de conhecidos. Segundo o último Anuário, publicado em 2022:

“Quanto à característica do criminoso, esta continua a mesma: homem (95,4%) e conhecido da vítima (82,5%), sendo que 40,8% eram pais ou padrastos; 37,2% irmãos, primos ou outro
parente e 8,7% avós” (FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. 16° Anuário de Segurança Pública. São Paulo: Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2022. Acesse em: https://forumseguranca.org.br/anuario-16/)

Pessoas que supostamente deveriam ser de confiança estão abusando crianças em ambientes familiares. E os poderes públicos pouco têm feito para evitar essas violências.

Outro tema que merece a atenção da sociedade é a Lei de Alienação Parental, que vem retirando a guarda de crianças das suas mães e entregando-as para pais abusadores, a partir de uma distorção do entendimento de situações de violência cometida por pais contra crianças. É de grande importância que essa lei seja revogada, pois tem sido utilizada para prolongar situações de abuso e sofrimento de crianças, gerando pesados traumas para uma vida inteira. Crianças são por definição pessoas vulneráveis, logo, requerem atenção e proteção total da sociedade para que suas vidas sejam preservadas.

Dado esse difícil panorama, venho propor o debate sobre as medidas para evitar as várias violências citadas.

Daniela Alvares Beskow

Texto lido na Câmara de Vereadoras e Vereadores de Campinas -SP, no dia 16 de março de 2023, durante a Reunião Extraordinária da Comissão da Mulher “Construção Coletiva de uma carta de reivindicações com os movimentos de mulheres”.

Artigo da seção Falas escrito por Daniela Alvares Beskow

Publicado em 31 de agosto de 2023

Acompanhe Palavra e Meia Semanal no Instagram: @_palavraemeiasemanal

Em breve, campanha de assinaturas!